Epifania no cristianismo Oriental e Ocidental

George Dion Dragas
Tradução do espanhol por Pe. André Sperandio

Tradição Oriental e Tradição Ocidental

A Epifania Oriental celebra o Batismo de Cristo no Rio Jordão por João Batista ou “Precursor” (em grego Prodromos), como o evento da manifestação de Cristo como Filho de Deus e seu corolário, a manifestação de Deus na Trindade, e também como o evento que marca o início da missão salvífica de Cristo. Isto é particularmente evidente na celebração da Grande Bênção das Águas (Megas Agiasmos), que evoca o Batismo de Cristo e constitui um aspecto conspícuo da celebração oriental.

A Epifania Ocidental celebra a veneração do Cristo recém-nascido pelos sábios magos orientais como o evento que marca a manifestação da divindade de Cristo às nações. Especialmente desde os tempos medievais, o cristianismo ocidental desenvolveu uma elaborada tradição em torno dessas figuras orientais – fixando seu número em três e identificando-as com três reis, chamados Melchior, Caspar e Balthazar – uma tradição que incluiu a redescoberta de seus corpos na igreja de Santo Eustorgio em Milão (1158), para onde haviam sido transferidos de Constantinopla no século IV, e sua remoção e depósito na Catedral de Colônia por Frederico Barbarossa (1164).

2. Contradição ou abordagens diferentes?

Esta divergência levanta naturalmente uma série de questões, tanto históricas como teológicas, às quais os liturgistas têm dado várias respostas. Acima de tudo, surge a pergunta: isso implica alguma contradição? Creio que não há aqui contradição, pois ambas as celebrações conduzem à mesma verdade primordial: a manifestação divina de Cristo e seu corolário, a manifestação divina do Deus Único na Trindade.

Por outro lado, é preciso dizer que a maneira como as duas tradições relacionam a Epifania com as outras grandes festas do ano litúrgico sugere uma diferença de abordagem do mistério de Cristo e da salvação que ele traz. A tradição oriental liga a Epifania à missão salvífica de Cristo e considera a Páscoa e o Pentecostes como seu resultado final e salvífico. A tradição ocidental liga a Epifania à vida terrena de Cristo, e considera seu objetivo como uma revelação gradual da pessoa salvadora de Cristo.

O objetivo deste artigo não é tratar de liturgia comparada. É simplesmente para facilitar uma compreensão mais clara das celebrações ortodoxas ocidentais e orientais da Epifania, já que essas celebrações não parecem ser facilmente compreendidas por cristãos comuns, ortodoxos orientais e ocidentais, embora vivam muito próximos uns dos outros aqui na América. Afinal, a repetição anual da festa oferece uma grande oportunidade de crescimento na compreensão e apreciação das riquezas da Tradição Cristã.

3. A Tradição Oriental

Estudiosos nos dizem que, no Oriente cristão, a Epifania é a festa mais antiga do Senhor depois da Páscoa, e sempre foi celebrada em 6 de janeiro. A primeira referência à Epifania é encontrada em Clemente de Alexandria, no final do século II. Se a Páscoa marcou o clímax da obra salvífica de Cristo, a Epifania marcou a revelação da pessoa divina de Cristo, que expôs o mistério de Deus e iniciou o processo de salvação do homem.

Originalmente, a Epifania comemorava o Batismo de Cristo, com Seu Nascimento talvez sendo implicitamente incluído. São João Crisóstomo explica as razões pelas quais é assim: “Por que não é o dia em que Cristo nasceu chamado Epifania, mas o dia em que foi batizado? Porque não se manifestou a todos quando nasceu, mas quando foi batizado” (Homilia 24 sobre o Batismo de Cristo). Em alguns lugares, no entanto, não apenas o nascimento, mas também alguns eventos adicionais na vida de Cristo estão incluídos na celebração da Epifania (por exemplo, o primeiro milagre de Cristo em Caná).

O que é particularmente interessante notar é que, nos primeiros séculos cristãos, vésperas da Epifania, da Páscoa e do Pentecostes (e do Natal mais tarde), eram as ocasiões solenes da iniciação cristã através do batismo. O vestígio desta prática hoje é o canto do hino batismal na Divina Liturgia celebrada nestes dias:

“Vós que fostes batizados em Cristo, de Cristos fostes revestidos. Aleluia”.

Foi no século IV que o nascimento de Cristo começou a ser comemorado como uma festa separada em 25 de dezembro, permitindo que a Epifania se concentrasse no Batismo de Cristo, e fosse celebrada em 6 de janeiro como ainda é hoje. Há evidências de que a festa do Natal, como uma festa separada, foi introduzida pela primeira vez em Roma (por volta do ano 335), e foi gradualmente adotada pelas Igrejas Orientais (a partir de 376).

4. Por que 6 de janeiro?

Por que o dia 6 de janeiro foi escolhido para a Epifania e por que o dia 25 de dezembro foi introduzido para o Nascimento de Cristo mais tarde? Os estudiosos fornecem várias respostas. Um deles nos diz que, de acordo com o antigo calendário egípcio, 6 de janeiro era o dia do solstício de inverno, o dia mais importante de celebração religiosa para os pagãos. Alguns pagãos (especialmente os egípcios) celebraram neste dia a conquista das trevas do inverno pelo invencível deus-sol. Outros celebraram o aparecimento e glorificação do deus-imperador em uma cidade (especialmente os romanos). Os cristãos, que reconheciam Cristo como “o sol da justiça” (Mal 4:2) e a “luz do mundo” (Jo 1:9 e 8:12), substituíram o culto ao deus-sol pagão e a glorificação do deus-imperador pelo culto a Cristo.

Posteriormente, no calendário neoromano, o solstício de inverno foi colocado em 25 de dezembro, e a ocasião foi prevista para outra celebração pagã. Os cristãos encontraram a oportunidade de introduzir um novo feriado, o Natal, comemorando o nascimento de Cristo, que é Emanuel, Deus conosco.

O que é importante notar aqui é que o fenômeno natural da “conquista” do sol da escuridão do inverno deixou de ser visto como divino, ou como um sinal do aparecimento de um líder humano divinizado. Em vez disso, tornou-se uma ocasião para celebrar a manifestação do verdadeiro Deus como homem, vencendo as trevas da ignorância e do pecado que levaram a humanidade a ser alienada do verdadeiro Deus e a adorar a criação em vez do Criador.

5. A importância da Festa

O estabelecimento do Natal não diminuiu a importância da Epifania, que é denotada pelo período de tempo de sua celebração. É comemorado de 2 a 14 de janeiro. O dia 6 de janeiro é o principal dia de festividade. Os 4 dias que a precedem constituem a pré-festa (proeortia) e os 8 dias seguintes a pós-festa (metheortia). A pré-festa é mais curta por causa da celebração da circuncisão de Cristo (século 8 em diante), em 1º de janeiro (que também é a festa de São Basílio); no entanto, inclui uma celebração elaborada na véspera da festa, como acontece no Natal e na Páscoa. A pós-festa inclui a Sinaxe de São João Batista (7 de janeiro), o domingo após a Epifania e a despedida da festa (14 de janeiro).

O significado profundo da festa é revelado nos vários hinos maravilhosos que são cantados nela e nas leituras bíblicas. Há dois hinos característicos que resumem perfeitamente esse significado: o Apolitikion (tropario) e o kondakion. Eles recordam como Cristo, em seu Batismo, foi proclamado o Filho de Deus muito amado, em quem Deus se agrada e o Espírito de Deus repousa (Mt. 3:17), e como essa revelação constitui um evento de esclarecimento e iluminação divinas.

Quando fostes batizados no Jordão, Senhor, manifestou-se o culto à Trindade. Porque a voz do Pai deu testemunho de Ti, chamando-te Seu Filho amado, e o Espírito, em forma de pomba, confirmou a verdade da palavra. Ó Cristo, que se manifestou e iluminou o mundo, glória a Ti”

(Apolitikion).

“Tu te manifestaste hoje ao mundo inteiro, e a tua luz, ó Senhor, apareceu sobre nós, para que te supliquemos com razão: Vieste e te manifestaste como Luz Inacessível!”

(Kontakion)

Finalmente, a Grande Santificação das Águas, que é observada duas vezes, na vigília e no dia da festa, revela a mensagem da salvação. “Cristo não foi batizado para ser santificado, mas para santificar as águas e, por meio delas, conferir a santificação divina a toda a humanidade” (Gregório Taumaturgo). Este é exatamente o dom que é concedido a todos os homens quando são batizados em Cristo. O batismo une os homens a Cristo, conferindo-lhes a remissão dos pecados e a vida eterna através da graça santificante de Deus. A água santa na Epifania é uma grande bênção, muito estimada pelos ortodoxos, que a usam para santificar seus lugares e a si mesmos.

6. A Tradição Ocidental

Estudiosos nos dizem que as origens da festa da Epifania no Ocidente são um tanto obscuras. Há um consenso de que a Epifania foi introduzida pela primeira vez na Igreja Ocidental a partir do Oriente no século IV, mais ou menos na mesma época em que a nova festa do Natal se enraizou na liturgia romana.

A Epifania foi estabelecida pela primeira vez no Ocidente em lugares que tinham contatos especiais com o Oriente, como a Gália, a Espanha e a Alta Itália, onde manteve um conteúdo oriental, comemorando o Nascimento e o Batismo de Cristo, e outros eventos. Essas tradições foram substituídas quando a autoridade de Roma sobre esses lugares aumentou, já que Roma seguiu outra tradição.

Também foi observado em Roma, comemorando inicialmente o Nascimento e o Batismo de Cristo, mas aqui passou a ser associado principalmente à visita dos reis magos a Belém, especialmente após o estabelecimento da festa do Natal em 25 de dezembro. Há evidências disso nos Sermões do Papa Leão (+461).

De acordo com uma teoria, a associação da Epifania com os sábios do Oriente pode ter sido devido à transferência, no século IV, das supostas relíquias dos magos de Constantinopla para Milão, uma tradição revivida na Idade Média, como mencionado acima. De qualquer forma, a Epifania Ocidental foi fixada no décimo segundo dia do Natal, ou seja, 6 de janeiro.

Diante disso, qual é o significado da Epifania para a Igreja Ocidental? É principalmente a manifestação de Cristo, o divino Salvador, aos gentios; mas é também o reconhecimento de Cristo pelos gentios. Esse duplo sentido é expresso pela maneira como a Igreja ocidental interpreta a oferta de ouro, incenso e mirra pelos sábios Magos. Por um lado, esses dons eram vistos como símbolos de três aspectos da vida de Cristo, como rei, sacerdote e profeta. Por outro lado, ele reapresentou a oferta, em vários sentidos, através da instituição de atos adequados de oferta: aos pobres, à Igreja e aos doentes.

Uma melhor perspectiva da Epifania Ocidental é alcançada quando se volta para os seis domingos da Epifania, que seguem a Epifania e conduzem a Tradição Ocidental para o novo tempo da Quaresma. Estes domingos de Epifania comemoram a automanifestação de Cristo: 1) aos doze anos de idade no templo; 2) em seu primeiro milagre em Caná da Galileia; 3) na cura do leproso e do escravo do centurião romano; 4) no acalmar da tempestade no mar da Galileia por causa de seus discípulos; (5) em seu ensino do bem e do mal, conforme estabelecido em sua parábola do trigo e do joio, e (6) em seu ensino da glória futura, conforme estabelecido em sua parábola do grão de mostarda.

Não há dúvida de que as tradições orientais e ocidentais da Epifania compartilham uma mensagem comum: a manifestação da identidade divina e da obra salvífica de Cristo. A diferença está no ethos e na ênfase. A Tradição Oriental parece estar mais em sintonia com o aspecto dramático e teofânico do ministério de Cristo, enquanto a Tradição Ocidental parece estar procurando seguir o Jesus histórico como ele se desdobra através de suas obras e palavras. A primeira é mais vertical; o outro mais horizontal. A combinação dos dois só poderia resultar em uma fonte de enriquecimento.

Notas

George Dion. Dragas, Ecclesiasticus II: Orthodox Icons, Saints, Feasts and Prayer, Orthodox Research Institute, 2005, págs. 168-174. Traducción de Martín E. Peñalva.