A Festa da Teofania

Gaetano Passarelli

Chamamos Chamamos Epifania este dia, diz São João Crisóstomo, “porque a graça salvífica manifestou-se a lodos os homens. E por que não chamamos de Epifania o dia do nascimento, mas aquele em que Jesus recebeu o Batismo? Simplesmente porque sua manifestação a todos os homens não aconteceu no nascimento, mas no batismo, uma vez que até então não o conheciam” [1].

A Igreja Bizantina − ainda para designar esta solenidade, emprega os termos “Epifania” e “Teofania”, que indicam a manifestação da divindade − prefere a denominação dada por São Gregório Nazianzeno: “Festa das Luzes” [2].

A denominação é ao mesmo tempo trinitária e cristológica. Vejamos brevemente em que sentido.

Cristo veio para ser a luz do mundo que ilumina os que andavam nas trevas [3].

Diz, com efeito, Proclo de Constantinopla:

“Cristo aparece no mundo, ilumina-o e o cobre de alegria, santifica as águas e difunde a luz nas almas dos homens. Apareceu o Sol de justiça e dissipou as trevas da ignorância. O Filho único do Pai manifestou-se e nos dá, mediante o batismo, a qualidade de filhos de Deus” [4].

Esta frase resume o pensamento dos Padres sobre a miséria do pecador, que consiste essencialmente na ignorância da fé: Cristo abre para sempre “as portas da Luz àqueles filhos das trevas e da noite, que aspiram a chegar a ser filhos do dia e da luz” [5].

Nossa profissão de fé, o Creio, contém a fórmula “Luz de Luz”, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, precisamente porque no Jordão manifestou-se a Luz, a Santíssima Trindade: “enquanto Jesus descia às águas, acendeu-se o fogo no Jordão” [6]; “e quando foi batizado, emergiu da água uma grande luz que se espalhou ao derredor, de maneira que todos os presentes fossem tomados pelo medo” [7].

A combinação de luz e fogo, como elementos reveladores da presença divina, encontra-se várias vezes no Novo Testamento; está efetivamente escrito:

“O Senhor ia diante deles (…) em coluna de fogo para iluminá-los, de modo que pudessem caminhar (…) de noite” (Ex 13, 21).

Iluminava a escuridão e os conduzia ao Mar Vermelho, cuja travessia é uma prefiguração do Batismo: o batismo é passagem, é iluminação, é nascimento do ser para a luz divina [8].

Por este motivo, os recém-batizados são chamados de “iluminados” na Igreja Bizantina, porque alcançaram a Luz que os guia, renasceram para a vida.

“Nele estava a Vida”, diz São João, “e a vida era a Luz dos homens. A luz brilha nas trevas e as trevas não a compreenderam”. Apareceu um homem, enviado por Deus, que se chamava João; este veio como testemunha, para dar testemunho da luz e que por ele todos chegassem à fé. Não era a luz, era somente testemunha da luz. A luz verdadeira, a que ilumina todo homem, estava chegando ao mundo: Estava no mundo e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o reconheceu. Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Mas a todos aqueles que o receberam, aos que creem no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus”. Os quais não nasceram do sangue nem da vontade da carne nem da vontade do homem, mas sim de Deus (Jo 1,10-13)

Portanto, o Ofício é completamente dedicado ao Batismo, e a cerimônia da Bênção das águas (Mégas Haghiasmós), que tem lugar na ocasião, remete à santificação do elemento básico do criado, realizada pelo Salvador: a água servirá para benzer posteriormente as casas, as fazendas, os sítios, o gado, tudo.

Além disso, dá-se grande importância à função revelada do Verbo encarnado [9] e compreende-se a predileção dos bizantinos pelo título de “Festa das Luzes”, não como simples referência terminológica, mas como expressão mais adequada aos motivos teológicos de sua espiritualidade e mentalidade.

A Epifania, de modo diferente do Natal, é uma festa de origem oriental. Sua testemunha mais antiga encontra-se em Clemente de Alexandria (pelos anos 150-200) [10].

É sabido que esta era uma festa celebrada pelas seitas gnósticas dia 6 ou 10 de janeiro, da qual os ortodoxos não foram muito seguidores, a ponto de até a metade do século III, na Alexandria, Orígenes nem a ela se referir. Somente no século IV começaram a aparecer testemunhas seguras de sua celebração entre os ortodoxos das diversas igrejas da Palestina, da Síria e da Ásia Menor. Parece que, neste período, deu-se a mudança das festas: o Oriente começou a celebrar a Natividade, enquanto o Ocidente festejava a Epifania.

No Oriente, a “nova” festa do Natal ligou-se à Epifania em 6 de janeiro. A Igreja Bizantina, no entanto, adotou de um dia para outro a data de 25 de dezembro para comemorar o Natal e a lembrança dos Magos, deixando que o dia 6 de janeiro voltasse a ser exclusivamente a festa do Batismo de Cristo [11].

NOTAS:

  1. Homilía 37 sobre el Bautismo, PG 49, 365-366.
  2. Oración 11, 46; Oración 40, 24.
  3. Mt 4, 16.
  4. PG 65, 757-761.
  5. Orígenes, Contra Celsum, 2, 67; PG 11, 90l.
  6. Taciano, Diatessaron, 88,3.
  7. Gli Evangeli Apocrifi (trad. F. Amiot), MiIão, 1964, 32.
  8. Cf. P. Evdokimov, Teologia della Belleza, Roma, 1971, 336.
  9. T. Spidlik, Spiritualité de l’Orient Chrétien (Or. Chr. An., 206), Roma, 1978, 37, 183-185.
  10. Stromata, 1, c. 21; cf. PG 8, 888.
  11. Cf. B. Botte, Les origines de la Noel et de I’Epiphanie. Étude historique, Louvain, 1932; A. Homman-F.P. Quere-Jaulmes, Le Mystére de la Noël, Avent, Epiphane, Paris, 1963; L. Lemarie, La manifestation du Seigneur: La Liturgie de Noël et de l’Epiphanie, Paris, 1957.

FONTE:

PASSARELLI, G. (1996). O Ícone da Teofania. São Paulo: Ave Maria.