Hino «Phos hilaron» – «Luz Jubilosa»

Hino «Phos hilaron» - «Luz Jubilosa»

«Phos hilaron»
Luz jubilosa da santa glória
do imortal Pai Celeste, Santo,
Bem-aventurado, Jesus Cristo.Chegados ao pôr do sol,
contemplando a luz vespertina,
nós louvamos o Pai e o Filho
e o Espírito Santo de Deus.Tu és digno em todo tempo
de ser louvado por vozes puras,
ó Filho de Deus, Doador da Vida,
todo o Universo Te glorifica!
Reflexão sobre o texto
Entre os testemunhos proporcionados por Basílio, ao lado de homens como Clemente de Roma e Ireneu, Orígenes e Gregório Taumaturgo, que atestam a experiência da vida “no Espírito”, Basílio cita igualmente a antiga oração da noite, hoje novamente usada na liturgia [latina]: o Phos hilaron, “Luz jubilosa” (29.73).
Eis como o bispo introduz a oração do lucernário, da qual ele cita apenas um extrato, e nós a damos integralmente:
Um fato ainda, do qual em outras circunstâncias certamente não valeria a pena falar, mas para mim, acusado de inovar, ele é um testemunho que sou obrigado a acrescentar em razão de sua antiguidade.
Nossos pais julgaram conveniente não receber em silêncio a luz da noite, mas dar graças quando ela aparece. Quem seja o pai dessas palavras de ação de graças do lucernário, somos incapazes de dizer!
Nem por isso o povo deixa de repetir a antiga fórmula, e ninguém pensa que se deva acusar de impiedade os que dizem: Nós louvamos o Pai e o Filho e o Espírito Santo de Deus (29.73).

O texto transmitido
A ação de graças do lucernário ou «Phos hilaron», da qual Basílio cita a doxologia trinitária, foi encontrada num manuscrito dos séculos II ou III e editada, em 1815, por J. F. Routh. Depois foi publicada muitas vezes em várias antologias até as “Priéres des premiers chrétiens”, que, em 1952, a deram a conhecer ao grande público. Ela acaba de entrar para a Liturgia das Horas [da Igreja Latina].
A citação de Basílio tem apenas uma variante em relação ao texto recebido: o verbo ainoumen («nós louvamos») em vez de hymnoumen («nós cantamos»). Basílio a chama literalmente «ação de graças à luz das lâmpadas». A liturgia do lucernário dos gregos corresponde mais ou menos às […] vésperas da Igreja Latina. Ela era celebrada ao anoitecer, que no Oriente se verifica mais cedo, quando os fiéis acendiam círios e tochas. Temos um testemunho disso na Vida de Macrina, 25, escrita por Gregório de Nissa.
Análise do Hino
1. Divisão
O hino se divide em três estrofes de extensão desiguaL A primeira se dirige a Cristo, a segunda à Trindade, a terceira, de novo, ao Filho de Deus. Essa alternância aproxima o «Phos hilaron» do «Gloria in excelsis». Existem, portanto, dois pólos: um crístico, o outro trinitário.
Trata-se, não de uma justaposição, mas de uma progressão, como o comentário mostrará. A primeira estrofe se dirige a Cristo, enviado do Pai, a segunda o contempla como Filho no mistério trinitário, a terceira contempla o Filho de Maria em sua filiação divina.
2. Os temas dominantes
Os dois termos que abrem e fecham o hino exprimem os dois temas dominantes na oração: luz e glória. Logo no começo, o tema da luz se afirma. Ele serve de motivo condutor (v. 1, 4-5). Ele é motivado ao mesmo tempo pela hora do dia e pelas lâmpadas acesas, talvez em reação contra o culto do Sol. Veremos como os cristãos interpretavam o simbolismo da luz.
Ligado à luz encontramos o tema da glória (v. 1,11), que abre e fecha o hino. Este se encerra com o termo glória como um acento enfático. Esse tema bíblico foi amplamente desenvolvido pelo Tratado da Trindade. que permite focalizá-lo melhor.
A glória é propriedade de Deus como o poder e a santidade, mas primeira e essencialmente do Pai (5,8; 13,29). O Filho é «a irradiação» da glória do Pai (6,15). Ele é a sua manifestação mais perfeita (Jo 1,14). Essa glória indivisa é comum às três pessoas divinas (6,15).
Dar glória a Deus – doxologia – significa reconhecer e aclamar o mistério de Deus, que se revelou no decorrer de suas várias manifestações e de sua economia. Isso já era verdade no caso dos judeus, mas o é plenamente no caso dos cristãos, que acolheram o Filho no Espírito.
A Igreja e o cristão dão, pois, glória ao Pai «no Espírito» (26,63) no decorrer do tempo e se preparam para participar plenamente de seu mistério (16,42). A doxologia tem, portanto, um sentido atual e, ao mesmo tempo, escatológico.
3. Comentário
A primeira estrofe enraíza em Deus, seu Pai, o Jesus da história e da revelação, Messias prometido a Israel e às nações. Deus Pai é descrito como «imortal, celeste, santo», Essas afirmações são tradicionais: em são Paulo, nas confissões de fé e em hinos como o Glória, (Seria útil pesquisar exemplos no Novo Testamento).
Na Escritura, o tema luz exprime, muitas vezes, a revelação de Deus. Deus ilumina e salva (Sl 27,1; 36,10; 43,3; Mq 7,8: Is 60: 19-20). Deus volta para o homem a luz de sua face e lhe traz alegria e paz (Sl 4,7). (Veja uma Concordância).
O Messias traz a luz, tema caro a Israel. Ele mesmo é o «astro que se levanta e ilumina» (Lc 1,79), «luz das nações e glória de seu povo» (Lc 2,32). Esse tema é orquestrado tanto por são João como por são Paulo. Neste último ele assume uma iluminação pascal (pesquisar exemplos).
Clemente de Alexandria chama Cristo «Sol da alma» (protréptico VI. 68,4) e «Sol da Ressurreição»; Por isso o cristão, para orar, se volta para o Oriente, de onde vem a luz. Clemente cita um fragmento de hino a Cristo que se aproxima do Phos hilaron e, sem dúvida, continua Efésios 5,14:
… e Cristo Senhor te iluminará, ele, o Sol da Ressurreição, gerado antes da estrela matutina, Ele dá a vida por seus raios. (Protréptico 84, 1- 2)
A vinda de Cristo traz a alegria (Lc 2, 10) e a faz brotar onde ele se manifesta (Jo 8, 56). Ela é um componente de seu Reino e se manifesta também à vista das obras e das maravilhas de Deus (Lc 10, 17 e 20; 13, 17). Ela é um dom do Espírito (Gl 5,22:;Rm 14, 17). Essa alegria provém de que Jesus nos manifesta seu Pai e nos introduz em seu mistério, fazendo-nos filhos.
Na segunda estrofe, o pôr-do-sol e a luz lembram ao cristão que o tempo é dom de Deus, pelo qual é necessário dar graças; eles permitem igualmente subir de Cristo à glória de Deus trino, origem e fim de toda a história e termo do itinerário de seu povo.
Diante do dia que morre, o cristão contempla a luz que não morre, a luz eterna de Deus (1Pd 11, 4: 5, 4), para o qual ele dirige seus olhos e seus passos. Como nota Basílio em seu tratado, aqui as três Pessoas estão perfeitamente coordenadas num mesmo e único mistério, termo de toda a procura dos homens.
A terceira estrofe, como o Glória, volta a Cristo, pedra angular de toda a fé e de toda a oração, nosso grande irmão mais velho, para cantá-lo e contemplá-lo na glória de Deus. A sua filiação, da qual ele nos torna participantes, faz surgir em nós a oração: “Vem para o Pai” (Inácio, Rm 7, 2).
A estrofe retoma a aclamação do Apocalipse (4,11: 5, 9-12): «Tu és digno», espécie de confissão das obras de Cristo, as quais motivam o louvor e a oração. «As vozes santas». Esse objetivo é aplicado muitas vezes a Deus mesmo. São Paulo diz que na oração levantamos para Deus «mãos santas» (1Tm 2, 8). o que exprime, ao mesmo tempo, a intensidade de nossa confiança filial, de nossa segurança, fundada em nossa submissão, e de nossa espera.
Toda a missão de Cristo é resumida numa palavra: «que nos dá a vida» (comparar com o hino citado por Clemente de Alexandria). Tema joanino por excelência (11, 25; 14, 6; 17, 3). Vida que não pode ser tomada, que não conhece ocaso e nos abriga em Deus, o Vivente.
A última estrofe se alarga ao cosmo todo como alguns salmos; ele faz eco à oração dos cristãos. As vozes santas exprimem o cântico de toda a Criação.
- HAMMAN, Adalbert – G. Para ler os Padres da Igreja. São Paulo: Paulus, 1995.
- Fonte: Monasterio de la Transfiguración de nuestro Señor Jesucristo