1º Domingo de São Lucas
SUBSÍDIOS HOMILÉTICOS
«O Primeiro Domingo do Evangelho de São Lucas»
O Primeiro Domingo de Lucas inicia um novo tempo no Calendário Litúrgico Bizantino e dá-se após o encerramento das solenidades da Festa da Exaltação da Santa Cruz. O terceiro Evangelista é também autor dos Atos dos Apóstolos. Em seu Evangelho, Lucas relata a vida do Senhor enquanto esteve com seus discípulos ensinando, operando milagres e pregando o Reino de Deus. Nos Atos dos Apóstolos, Lucas relata a vida da Igreja primitiva, uma continuação da missão do Senhor.
Lucas era médico e ocupava uma posição social privilegiada, conhecia muito bem a língua grega e os costumes e tradições helênicas . Há fortes indícios de que acompanhou São Paulo em algumas de suas viagens, pois este refere-se a um “querido médico” que o auxiliava em sua árdua missão (Fl 24).
Mesmo pertencendo a uma classe social abastada, acentuou em seus escritos as passagens em que Jesus anunciava o Reino aos pobres, aos pecadores, às prostitutas. Este é o Reino anunciado por Jesus e que Lucas transmite através dos seus escritos.
Mas, para anunciar este Reino, esta Boa-Nova, o Senhor necessitou de colaboradores, ou seja, dos seus discípulos. Ele é o iniciador do Reino. É nele que os seres humanos atingem a condição de Filhos e são libertados do pecado. Nele os homens se tornam colaboradores de Deus na obra da Salvação. Em torno dele, como Pedra Angular, organiza-se uma comunidade de amor e de serviço missionário. Primeiramente, doze, depois muitos outros.
É de singular importância observarmos que Lucas relata que o Senhor está dentro da barca quando começa a pregar. Depois da pregação, eis que surgiu um pedido feito ao proprietário do barco: «Avança para as águas mais profundas». Em meio à uma mescla de admiração, com tons de contestação, diante daquele pedido, no entanto, surgiram palavras de confiança:
«Senhor, trabalhamos a noite toda e nada pescamos. Mas por tua palavra, lançarei as redes». (Lc 5:5)
A ordem de Jesus seria cumprida, não porque concluíssem que havia nelas uma razão plausível, mas porque Jesus pediu. «Por tua palavra», disse Pedro, «lançarei as redes».
Diante de um pedido de Deus, a razão humana cede seu lugar à obediência e a lógica passa a se orientar não mais por premissas do homem, mas por premissas explicáveis somente pela fé.
A palavra de Deus está presente no mundo, porém poucos a ouvem e por isso poucos a praticam. Por não se ouvir tais palavras, as redes teimam em permanecer no chão, ou quando são jogadas ao mar, são lançadas em águas razas.
Nosso Deus é o Deus da profundidade. Ele conhece o coração do homem. Ele sonda nossos caminhos. «Sondas-me, ó Deus, e conheces o meu coração! Prova-me, e conheces os meus sentimentos! Conheces até o fundo de minha alma» (Sl 139). Por isso mesmo, pede que joguemos as redes da pesca nas profundezas, pois lá encontrase o verdadeiro homem, e é este homem que Deus quer «pescar» em suas redes.
Para lançar as redes em águas mais profundas, é necessário sair da margem e da superfície. Nas margens, as águas são tranqüilas, calmas e não oferecem perigo nenhum. As águas mais profundas estão no mar aberto, longe do litoral, onde rodeia o perigo e a insegurança e é neste lugar que Jesus pede que façamos a pesca. Os que querem segurança e calmaria, continuarão a sentir a frustração de uma pesca fracassada. Os que se arriscam, «por tua palavra», sentirão insegurança, medo por causa das intempéries das águas profundas, porém terão uma dupla satisfação: a de obedecer a Palavra de Deus e se arriscar por ela e a alegria de sentir o peso das redes cheias, pois a pesca foi abundante. Na superfície, poucos peixes existem, talvez até inexistam. Se quisermos encontrar coerência na obediência da palavra de Deus que prestamos, é preciso sair da superfície e lançar as redes longe dela, para trazer para o Senhor peixes melhores.
Hoje somos convidados a seguir Jesus e nos tornar pescadores de homens para o Reino. Estes homens estarão nos lugares mais escondidos, mais insondáveis, isto é, nas águas mais profundas. Os chamados por Jesus, nos tempos hodiernos, antes de tudo, são convidados a experimentar o convívio com o Senhor, para depois partirem. É desta experiência pessoal com Deus que brota a coragem de se fazer ao largo e pescar longe das calmarias. É por causa dela que, de fato, nos reconheceremos pecadores, mas mesmo assim responderemos positivamente ao chamado que nos é feito, como aconteceu com Pedro, Tiago e João. A experiência pessoal com Jesus fará que tenhamos consciência de outra realidade: para lançarmos as redes em águas mais profundas, teremos necessidade de uma embarcação. É impossível permanecer longe das margens sem se fazer uso delas, ainda mais quando somos chamados a pescar.
O símbolo do barco é forte. A Igreja é este barco. A certeza de estarmos pescando para o Reino é o fato de estarmos cumprindo nossa vocação inseridos nela. Sem o barco ou sem a Igreja, corremos o risco de estar pescando não para Deus, mas para satisfazer nosso próprio ego. A vocação dos primeiros chamados se deu quando Jesus estava sentado no barco e, de dentro dele, lançou o convite para que Pedro, Tiago e João se tornassem pescadores de homens. O que nos credencia, de fato, a sermos vocacionados é a pertença a uma comunidade eclesial. Deus ainda é quem dirige este barco e, dele, ainda lança convites, ainda chama mais pescadores que tenham a coragem e o desprendimento de deixar tudo para segui-Lo.
A palavra grega «ECCLESIA», significa assembleia, reunião daqueles que são chamados, convocados. A Igreja é a comunhão dos chamados por Deus a viver no amor. Cada batizado é chamado pelo Senhor a «lançar as redes em águas mais profundas», lançar-se ao largo, sem medo. E, para isso é necessário fazer a experiência do ENCONTRO com o Senhor, como fizeram os discípulos, seguir seus passos, sentir sua PRESENÇA em nossas vidas. Quem faz esta experiência com o Deus-Amor, é imediatamente compelido a uma adesão e a um compromisso de anunciar, de evangelizar. Amém.
STORNIOLO, Ivo. Como Ler o Evangelho de Lucas, São Paulo: Ed. Paulus.