Sinaxe dos Ss. Pedro e Paulo
SUBSÍDIOS HOMILÉTICOS
A «Sinaxe dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo»
Os cristãos orientais observam, ainda hoje, o jejum em preparação à festa dos santos Pedro e Paulo. Faz parte dos quatro períodos de jejum do ano litúrgico bizantino. Sua duração é variável porque começa na segunda-feira que se segue ao Domingo de Todos os Santos (1º Domingo depois de Pentecostes). Depois da Santa Mãe de Deus, a Theotokos, é a única festa de santos, precedida por um tempo de jejum.
Também a iconografia dá um destaque particular aos Príncipes dos Apóstolos. Observamos a admirável fidelidade com a qual, no Oriente, foi transmitida a fisionomia característica dos dois santos.
Isso nos faz pensar que os primeiros iconógrafos a retratá-los, lhe foram contemporâneos. Não devemos nos admirar, se em diferentes regiões geograficamente distantes umas das outras, encontramos o mesmo e persistente modelo iconográfico.
Pedro é sempre reproduzido com a fronte baixa, os cabelos grisalhos e um pouco encaracolados, a barba curta e arredondada; tem na mão as chaves e, usualmente, porta a cártula em que a inscrição mais frequente é a proclamação de fé: «Tu és o Cristo, filho do Deus vivo» (Mt 16,16).
Paulo, ao invés, tem um aspecto mais jovem, com poucos cabelos; a fronte alta é evidenciada também pela calvície e a barba desce mais longa e lisa.
No Ocidente, São Paulo é quase sempre retratado segurando uma espada, ao passo que no Oriente, com frequência, nós o vemos tendo nas mãos o livro das suas Epístolas. É assim que o admiramos no belíssimo ícone do maior iconógrafo russo, o monge Andrej Rublev. Tal ícone, do século XV, foi pintado para a Iconostase da catedral de Zvenigorod.
As particularidades das duas fisionomias permitem reconhecer Pedro e Paulo também em ícones em que os dois santos aparecem juntos com outros santos, como, por exemplo, no ícone de 15 de agosto, Dormição da Mãe de Deus; ou no de Pentecostes. Mais tardios são os ícones onde os Príncipes dos Apóstolos aparecem no grupo dos Doze. Neste ícone, os santos Pedro e Paulo, no centro, seguram dos dois lados a maquete de uma Igreja, em formato bizantino, um simbolismo evidente do papel único dos dois na Igreja instituída por Cristo para a continuação da sua obra salvífica entre os homens.
Os Santos Apóstolos Pedro e Paulo
DONADEO, Madre Maria, O Ano Litúrgico Bizantino. São Paulo: Ed. Ave Maria, 1990.
Dois homens com a mesma missão, mas diferentes na origem, temperamento e visão pastoral.
Simão Pedro, um pescador de Betsaida que mais tarde foi se estabelecer em Cafarnaum e, obedecendo ao mandato do Senhor, transforma-se em «Pescador de Homens» para o Reino. Paulo, soldado romano, perseguidor dos cristãos e com uma carreira promissora dentro do Império, torna-se o destemido apóstolo missionário, fundador de igrejas, em diversos países. Ambos chamados, tiveram seus nomes mudados depois de uma forte experiência da Presença do SENHOR em suas vidas. Simão recebe o nome de «Pedro» (Mt 16,17-19), resultante da sua profissão de fé em resposta à pergunta que o Senhor lhe havia dirigido sobre sua identidade. Movido pelo Espírito Santo Simão lhe responde «Tu és o Cristo, o Filho de Deus».
Sobre a «Fé» de Simão expressada em sua resposta, o SENHOR edifica sua Igreja: «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja» (Mt 16,18).
Saulo de Tarso, sofrendo a tão conhecida «Queda», convertido após a aparição do SENHOR, transforma-se em Paulo; de perseguidor a propagador do Evangelho. Sua retórica e poder de persuasão foram colocados a serviço do seu apostolado. De Antioquia foi para a Ilha de Chipre e percorrendo depois a atual Turquia, Frigia, Galícia, Filipos, Corinto, Tessalônica. Em Atenas anunciou o Deus desconhecido aos filósofos gregos. Chegou a Roma pelo ano 60 ou 61, onde foi preso e redigiu suas Cartas às comunidades eclesiais recém fundadas. Paulo sofreu o martírio aproximadamente no de 67, não sem antes ter ressaltado nas Cartas a Timóteo: «Combati o bom combate, percorri o caminho e guardei a fé» (2Tm 4,7).
Pedro e Paulo: dois nomes que ao longo dos séculos personificam a Igreja inteira em sua ininterrupta Tradição, sendo por isso invocados com frequência, tanto nos ritos orientais como latinos da Igreja.
«Senhor, Tu sabes tudo, Tu sabes que te amo»
S. GREGÓRIO PALAMÁS, Homilia 28,
Leitura para a Solenidade de São Pedro e São Paulo
(Comentário a Jo 21,15-19)
Contemplando Pedro, podemos verificar que não só expiou suficientemente por suas lágrimas de penitência a negação em que tombou, como também afastou de sua alma o vício da arrogância, pelo qual se julgava acima dos outros. Querendo demonstrá-lo a todos, o Senhor, depois de ter padecido por nós em sua carne e ressuscitado ao terceiro dia, disse a Pedro, conforme as suas palavras no Evangelho de hoje: Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes? (Jo 21,15), quer dizer, mais do que estes meus discípulos?
Vede como se tornou humilde! Outrora, mesmo sem ser interrogado, antepunha-se aos outros, dizendo: Ainda que todos te reneguem, eu nunca (cf. Mc 14,29 e Jo 13,37-38). Agora, interrogado se amava mais do que os outros, afirma que ama, mas isenta-se de comparações, dizendo: Sim, ó Senhor, tu sabes que te amo (Jo 21,15). E que faz o Senhor? Depois de mostrar que Pedro não deixara de amá-lo e se convertera à humildade, cumpre abertamente o que já lhe anunciara, dizendo: Apascenta os meus cordeiros (Jo 21,15). Se quando Cristo chamando edifício à assembléia dos que nele crêem, promete que tomará Pedro como pedra fundamental (cf. Mt 16,18); se quando fala de pesca, o faz pescador de homens dizendo: de agora em diante serás pescador de homens (cf. Mt 4,19); quando chama os seus de rebanho, coloca Pedro à frente como Pastor, dizendo: Apascenta meus cordeiros, apascenta as minhas ovelhas.
Pedro, porém, mais duas vezes interrogado por Cristo se o ama, entristeceu-se pela repetição da pergunta, julgando que sua afirmação não merecia crédito. Mas convencido do seu amor por Cristo, não ignorando que esse amor era mais conhecido por Cristo do que por ele próprio, vence o impasse não somente confessando o seu amor, mas também anunciando que a pessoa amada por ele é o Deus de todas as coisas: Senhor, tu sabes tudo, tu sabes que te amo (Jo 21,17). Pois saber tudo é privilégio exclusivo do Deus de todas as coisas.
O Senhor, então, não apenas constituiu o autor de tal proclamação pastor, e pastor supremo de toda a sua Igreja, mas também lhe anuncia que seria cingido de tal força que permaneceria firme até à morte, e morte de cruz, apesar de não ter resistido outrora à pergunta e à afirmação de uma criada.
Em verdade, em verdade te digo (disse a Pedro), quando eras jovem e te cingias de juventude corporal e espiritual, usavas a tua própria força e ias onde desejavas, pois eras movido por tua vontade e vivias de acordo com tua escolha; quando porém envelheceres, chegando ao fim da tua juventude corporal e espiritual, estenderás as mãos (cf. Jo 21,18). Queria dar a entender com isto que Pedro morreria pela cruz, que iria padecer, mas não contra a vontade. Estenderás as mãos, e outro te cingirá, isto é, te fortalecerá, e te conduzirá para onde não queres, separando-te dos homens (cf. Jo 21,18). Mostrava assim que a nossa natureza quer a vida, e que o martírio de Pedro estava acima de suas forças humanas. Estas coisas, diz o Senhor, suportarás voluntariamente por minha causa, dando então testemunho de teres sido fortalecido por mim, pois não pode a natureza humana realizar o que está acima das forças humanas.
«Pedro faz uma exata profissão de fé em Cristo»
São CIRILO DE ALEXANDRIA,
Homilias sobre o Evangelho de Lucas,
(Lc 9,18-24: confissão de Pedro).
Um dia Jesus rezava com os discípulos em lugar retirado. E lhes fez a seguinte pergunta: Quem sou eu, no dizer das multidões? (Lc 9,18). O Salvador e Senhor de tudo mostrava-se como modelo de santidade ao rezar a sós com os discípulos. Talvez alguma coisa os perturbasse, provocando neles pensamentos de dúvida. Viam rezar como qualquer homem aquele que na véspera realizara prodígios divinos. Não era pois infundada a sua dúvida: que coisa estranha! O que pensar a respeito dele: é Deus ou homem?
Para acalmar o tumulto de tais pensamentos e tranquilizar uma fé quase abalada, Jesus lhes faz uma pergunta, sem ignorar o que dele se dizia entre os estrangeiros e mesmo entre os judeus. Queria desse modo, desviá-los da opinião de muitos, e neles consolidar uma fé segura. Quem sou eu no dizer das multidões? (Lc 9,18). De novo Pedro intervém em primeiro lugar, fazendo-se o porta-voz de todo o grupo, e pronunciando palavras cheias de amor a Deus, como exata e perfeita profissão de fé no Cristo: O Cristo de Deus (Lc 9,20). O discípulo é o arauto atento e sábio da verdade sagrada. Não diz simplesmente que é um Cristo de Deus, mas o Cristo de Deus. Pois muitos consagrados a Deus foram chamados cristos com significados diferentes: alguns eram reis e outros eram profetas. Outros ainda (e somos nós, que alcançamos a salvação por meio do Cristo Salvador universal, e somos ungidos do Espírito Santo) recebem o nome de Cristo. Por conseguinte, são muitos os cristãos; mas este é o nome que designa uma condição, ao passo que o outro é um só, o Cristo de Deus Pai.
Depois que o discípulo fez a profissão de fé, Jesus proibiu severamente que o dissessem a alguém, acrescentando: O Filho do homem deverá sofrer muito, ser rejeitado, e afinal ser morto, e ressuscitar no terceiro dia (Lc 9,21.22). Mas porque não convinha dizer isso a outros? Não era essa justamente a tarefa dos que foram consagrados por ele ao apostolado? Sim, mas diz a Escritura: Tudo a seu tempo será comprovado (Sir 39,34). Convinha anunciar primeiro os acontecimentos ainda não consumados: a paixão, a crucifixão, a morte na cruz e a ressurreição. Este grande e glorioso milagre confirmará que o Emanuel é verdadeiro Deus, Filho de Deus Pai por natureza.
Na verdade, destruir a morte e a corrupção, espoliar o inferno, abater o poder do demônio, tirar o pecado do mundo e abrir para os homens as portas do paraíso unindo céu e terra, tudo isso mostra que o Emanuel é verdadeiro Deus. Por isso Jesus ordena que o mistério seja por algum tempo adorado em silêncio, até que todo o processo da economia chegue a seu término. Assim, depois da ressurreição ordenou que se revelasse o mistério por todo o mundo, oferecendo a todos a justificação pela fé e a purificação pelo batismo: Todo poder me foi dado no céu e na terra. Ide, fazei de todos os povos discípulos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a guardar tudo o que vos mandei. Estarei convosco todos os dias, até o fim dos tempos (Mt 6 28,18-20). Portanto, Cristo está conosco e em cada um de nós, pelo Espírito Santo. Por ele e com ele sejam dadas louvor e poder a Deus Pai, com o Espírito Santo, pelos séculos. Amém.
«O mais antigo testemunho histórico do martírio de Pedro e de Paulo»
SÃO CLEMENTE DE ROMA,
Carta aos Coríntios, 5-7
Deixemos estes exemplos [de perseguição no Antigo Testamento] para nos concentrarmos nos atletas mais próximos de nós; evoquemos os exemplos valentes da nossa geração. O ciúme e a inveja desencadearam perseguições contra os mais elevados e mais justos pilares da Igreja, que combateram até à morte. Olhemos os santos apóstolos: Pedro, por causa de um ciúme injusto, foi sujeito, não a um nem a dois, mas a numerosos sofrimentos; depois de assim ter dado o seu testemunho, partiu para o descanso na glória que tinha merecido. O ciúme e a discórdia permitiram a Paulo mostrar como se obtém o prêmio reservado à constância. Sete vezes feito prisioneiro, exilado, lapidado, tornado pregador do evangelho no Oriente e no Ocidente, recebeu a fama que corresponde à sua fé. Depois de ter ensinado a justiça ao mundo inteiro, até aos confins do Ocidente, deu testemunho diante das autoridades; foi assim que abandonou este mundo para ir para o descanso da santidade. Modelo supremo de coragem! A estes homens que levaram uma vida santa, veio juntar-se uma grande multidão de eleitos que, em consequência do ciúme, sofreram todo o gênero de maus tratos e suplícios, e deram um exemplo magnífico entre nós. […]
Escrevemos-vos tudo isto, bem amados, não apenas para vos advertir, mas também para vos exortar. Porque nos encontramos na mesma arena; espera-nos o mesmo combate. Deixemos, pois, as nossas vãs e inúteis preocupações, para seguirmos a regra gloriosa e venerável da nossa tradição. Tenhamos os olhos fixados naquilo que é belo, naquilo que é agradável aos olhos daquele que nos criou, naquilo que lhe toca. Fixemos o olhar no sangue de Cristo e compreendamos o valor que tem para Deus seu Pai, pois que, derramado pela nossa salvação, obteve para o mundo a graça da conversão.