Sobre o Jejum – νηστεία

A oração, o jejum e a participação ativa na Divina Liturgia, há séculos, constituem os fundamentos da vida cristã ortodoxa.

Entretanto, cada época oferece desafios, e atualmente, em especial no Ocidente, observa-se o avanço da secularização na sociedade, e seus efeitos. A precarização das relações humanas, a virtualização da vida, a banalização e dessacralização dos corpos e a indução de comportamentos artificiais, são apenas alguns dos fatores que contribuem para o reducionismo gradativo da entidade humana. Em consequência, o neopaganismo e o ateísmo, apresentam-se como respostas religiosas (ou crenças) semi-fabricadas, prontas a atender uma sociedade de consumo, ainda que inaptas e insuficientes para sanar as lacunas existenciais do ser, distanciando-se da verdade necessária.

Em meio a este cenário, a fé verdadeira e ortodoxa, mesmo em relativo silêncio, proclama: sem participação ativa do ser, nos fundamentos da Igreja, não há Cristo. A via de cura espiritual para o gênero humano, propósito da Igreja, é essencialmente cristocêntrica. O secularismo, justamente pelo alheamento em relação às realidades espirituais, tende a alterar a percepção do caráter ontológico das práticas eclesiásticas fundamentais, incluindo, a natureza do jejum, refletindo-a erroneamente como uma atividade singular, quase desnecessária e incompatível a contemporaneidade. Ao contrário, sob a perspectiva ortodoxa, o jejum é integrante do processo de cura no homem.

Para iniciar o entendimento sobre o jejum, é necessária a contextualização simbólica e histórica, reunir fontes da tradição, escrituras, e sobretudo, fazer-se conhecido o sentir e o pensar dos santos que o viveram. É preciso voltar ao passado, de encontro ao espírito dos primeiros cristãos da Igreja Primitiva, compartilhar de sua fé e visão de mundo, avançar para a compreensão dos ciclos do calendário litúrgico e contemplar a motivação dos homens que engendraram o jejum. Também é preciso deixar-se permear pelo silêncio do deserto e pelo espírito de ascese, entender a natureza do combate espiritual, para então, caminhar com Cristo até a Cruz, e com ele ressuscitar na Páscoa (…).