Domingo Antes da Natividade
SUBSÍDIOS HOMILÉTICOS
«Jesus, o Messias, realiza as promessas de Deus»
O calendário Litúrgico Bizantino festeja neste domingo, que antecede o Natal, a Genealogia de Jesus, como filho da humanidade. Tanto São Lucas como São Mateus nomeiam as gerações que antecederam o nascimento do Filho de Deus. O primeiro capítulo do evangelho de Mateus situa Jesus no tempo e na história dos homens como parte principal do projeto de Deus. Já se mostra aqui todo o mistério da pessoa e da ação de Jesus, verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus.
São Lucas apresenta a genealogia, não no primeiro capítulo como faz São Mateus, mas no capítulo terceiro, após falar de João Batista que veio antes para preparar o caminho do Senhor. Depois de apresentar Jesus como Filho de Deus, Lucas O apresenta como Filho da Humanidade. A genealogia é uma forma de contar a história, que é uma sucessão de gerações.
Orígenes, um dos padres da Igreja do século III, encontra nos textos sagrados de Mateus e Lucas base sólida para defender a dupla natureza do Messias. Ressalta que José é chamado o “esposo de Maria” e não, como era costume dizer, Maria como a esposa de José. Defende deste modo a linhagem de Jesus vindo de Maria.
«Livro da origem de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão». (Mt 1,1)
Este é o título deste capítulo, e resume quem é a pessoa de Jesus. O Antigo Testamento se abre com o livro do Gênesis (origem) , contando o início do universo e da humanidade. Com Jesus tem início a nova Criação, uma nova Humanidade. Ele é o novo Adão.
Abraão representa o começo do povo de Deus.
Sua aspiração mais profunda era ter uma terra e uma descendência. Deus lhe prometeu ser pai de um grande povo e possuir uma terra imensa (Gn 12). Mas é em Jesus, que ecoa toda a aspiração e história de um povo particular que reflete a história de toda a humanidade.
Podemos achar monótonas as listas de gerações que aparecem na Bíblia, inclusive esta, feita por Mateus. Falta compreensão de nossa parte. Acontece que para os antigos a história era uma sucessão de gerações. De pai (e mãe) para filhos passava não apenas a vida física, mas também todos os ideais e aspirações, problemas e lutas, vitórias e derrotas: «O que ouvimos e aprendemos, o que nos contaram nossos pais, não o esconderemos aos seus filhos; nós o contaremos à geração futura… os filhos que iriam nascer… Que se levantem e os contem aos seus filhos, para que ponham em Deus a sua confiança. .. para que não sejam como seus pais.. . cujo espírito não era fiel a Deus» (Salmo 78,1-8).
A história, portanto, é uma transmissão da consciência e da experiência que pouco a pouco vão formando a sabedoria que ensina a viver. Ouvindo a história dos pais, os filhos aprendem a viver melhor. Sabedoria é discernir o caminho da vida, e bom-senso é caminhar por ele.
Jesus é fruto de uma história de aspirações, buscas, lutas, derrotas e conquistas. Retomando toda a nossa história, ele nos ensina o caminho da vida, para que de fato encontremos aquilo que todos buscaram. O que buscamos? A realização de nossas aspirações mais profundas, que coincidem com o projeto de Deus: vida e liberdade para todos. Mas, para que todos tenham isso, é preciso justiça. E é exatamente o caminho da justiça que Jesus, segundo Mateus, vai nos ensinar. Jesus, portanto, responde não só à busca do seu povo, mas de todos os povos, de todos nós. Podemos não ver refletida nele a nossa pessoa como ela é, mas, olhando bem, nele descobriremos nossas aspirações mais profundas, e a realização daquilo que Deus nos chamou a ser.
Depois de contar a história do povo através de uma lista, Mateus conta como foi o nascimento de Jesus (1,1825). Não é uma crônica biográfica, mas o relato do mistério que cerca não só a vida de Jesus, mas a vida de toda a humanidade.
Jesus não é apenas um filho da História Humana. Ele é o Filho de Deus. Sua mãe é humana. Seu Pai é Divino. Nele se resume o mistério que é a Vida. Deus tem a iniciativa, porque Ele é a Vida plena, geradora de toda vida.
Maria, representante da humanidade que recebe a vida de Deus, em sua virgindade concebe a vida de Jesus de modo inteiramente inesperado. É o Espírito de Deus que nela, e em nós, produz a vida nova. Assim, o nascimento de Jesus, resposta de Deus aos anseios da humanidade, começa por nos ensinar que a vida é fruto da iniciativa de Deus em contato com a nossa atitude aberta e receptiva, como a atitude de Maria.
«A Virgem acolheu em seu seio o Verbo Divino, o qual, desde a eternidade, coexistia com Deus. Fez-se grandioso templo da divindade, ela, morada humilde e humana. Aquele que não podia ser contido na pequenez do corpo humano, ei-Lo na estreiteza do ventre virginal. O anjo ao dizer ‘conceberás em teu ventre e darás à luz um menino’ indica que é uma concepção real e não metafórica. É Deus que se encarna».
Com estas palavras S. Pedro Crisólogo, grande e eloquente patrístico da igreja Indivisa do ano de 420, concluiu seu sermão de Natal.
Jesus, o Emanuel, o Deus-conosco, nos ensina a obter a verdadeira liberdade e a viver a verdadeira vida, a fim de nos tornarmos o que Deus deseja. O termo «Deus conosco», diz São Gregório de Nissa, surpreendeu a todos, pois a divindade se aproximou da criatura, fez-se pequeno sem perder nada de sua essência. Deu à humanidade algo tão precioso que até mesmo as criaturas celestes se admiraram com tamanha doação.
Ao refletirmos sobre a genealogia, preparemo-nos para as festividades do Natal, adorando o Deus-Menino nascido na gruta, cercado pelos animais e humildes pastores. Na aparência, um menino indefeso e frágil; na verdade, o DEUS Todo-poderoso!
Referências bibliográficas:
- GOMES, Folch. Antologia dos Santos Padres – São Paulo: Ed. Paulinas, 1979.
STORNIOLO, Ivo Como Ler o Evangelho de Lucas. São Paulo: Ed. Paulus. 4ª Ed..
A linhagem de Jesus Cristo
São Leão Magno (?-c. 461), Carta 31; PL 54, 791
De nada serviria dizer que Nosso Senhor, filho da Virgem Maria, é realmente homem, se não se acreditasse que o é como o Evangelho o proclama. Quando Mateus nos fala da genealogia de Jesus Cristo, filho de David, filho de Abraão, desenha, a partir da origem da humanidade, a linhagem das gerações até José, de quem Maria estava noiva. Lucas, pelo contrário, sobe os sucessivos graus que conduzem ao início do gênero humano, mostrando assim que o primeiro e o último Adão são da mesma natureza (3,23ss.).
O Filho de Deus onipotente poderia ter-Se manifestado para instrução e justificação dos homens como apareceu aos patriarcas e aos profetas sob forma carnal, por exemplo, quando lutou com Jacó (cf Gn 32,25), ou quando estabeleceu um diálogo com Abraão, aceitando a sua hospitalidade e tomando o alimento que ele Lhe ofereceu (cf Gn 18). Mas estas aparições eram apenas sinais, imagens do homem cuja realidade anunciavam […].
Nenhuma imagem poderia realizar o mistério da nossa redenção, preparado desde antes do tempo, desde toda a eternidade. O Espírito ainda não tinha descido sobre a Virgem, e a força do Altíssimo ainda não tinha estendido sobre ela a sua sombra (cf Lc 1,35). A Sabedoria ainda não tinha construído uma morada onde o Verbo pudesse encarnar, de modo que a natureza de Deus e a do escravo se unissem numa só pessoa, o Criador do tempo nascesse no tempo, e Aquele por quem tudo foi feito fosse gerado entre todas as criaturas. Se o homem novo não Se tivesse assimilado à carne do pecador e carregado a nossa decrepitude, se não tivesse condescendido, Ele que era consubstancial ao Pai, em tomar a substância de sua Mãe e assumir a nossa natureza, exceto no pecado, a humanidade manter-se-ia cativa, à mercê do demônio, e não poderíamos gozar da vitória triunfal de Cristo, porque esta teria acontecido fora da nossa natureza. É, por conseguinte, da admirável participação de Cristo na nossa natureza que brota para nós a luz do sacramento da regeneração.