«Não penseis que vim revogar a Lei ou os profetas; não vim revogar, mas completar»

Quereis saber como é que, longe de revogar a Lei e os profetas, Jesus vem confirmá-los e completá-los? Quanto aos profetas, fá-lo confirmando com as suas obras o que eles tinham anunciado; donde a expressão que Mateus utiliza com tanta frequência: «Para que se cumprisse a palavra do profeta…».

Quanto à Lei, cumpriu-a de três maneiras. Primeiro, não omitindo nenhuma prescrição legal. Com efeito, disse a São João Batista: «Convém que se cumpra toda a justiça» (Mt 3,15); e aos judeus: «Quem de vós pode acusar-me de pecado?» (Jo 8,46). […]

Em segundo lugar, cumpriu a Lei porque quis submeter-Se a ela pela nossa salvação. Ó prodígio! Ao fazê-lo, comunicou-nos a graça de também nós a cumprirmos, como nos ensina São Paulo: «O fim da Lei é Cristo, para que, deste modo, a justiça seja concedida a todo o que tem fé» (Rom 10,4); o Apóstolo diz também que o Salvador condenou o pecado na carne «para que assim a justiça exigida pela Lei possa ser plenamente cumprida em nós, que já não procedemos de acordo com a carne» (Rom 8,4); e ainda: «Quer isso dizer então que, com a fé, anulamos a Lei? De maneira nenhuma! Pelo contrário, confirmamos a Lei» (Rom 3,31). Com efeito, a Lei pretendia tornar o homem justo, mas não tinha capacidade para o fazer; por isso, Cristo, que é o fim da Lei, veio mostrar-nos o caminho que conduz à justiça, ou seja, à fé, cumprindo assim a intenção da Lei. A letra da Lei não podia justificar o pecador; mas a fé em Cristo pode justificá-lo. É por isso que Ele diz que não veio revogar a Lei.

Analisando com atenção, detectamos ainda um terceiro modo de cumprimento, que consiste nos preceitos que Cristo veio dar-nos: longe de reverterem a Lei de Moisés, estes preceitos são a justa consequência e o cumprimento natural da mesma.

São João Crisóstomo (c. 345-407)
Homilias sobre São Mateus, n.º 16
Fonte: Evangelho Cotidiano

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