«Ide também para a minha vinha»

O Senhor não pára, em tempo algum, de enviar trabalhadores para cultivar a Sua vinha […]: através dos patriarcas, dos doutores da Lei e dos profetas e, finalmente, através dos apóstolos, Ele procurava, por assim dizer, que a Sua vinha fosse cultivada por intermédio dos Seus trabalhadores. Todos aqueles que, a uma fé firme, acrescentaram boas obras, foram os trabalhadores dessa vinha […].

Os trabalhadores contratados desde o nascer do dia, da hora terceira, da sexta e da nona designam, portanto o antigo povo hebreu que, aplicando-se […], desde o começo do mundo, a prestar culto a Deus com fé firme, não parou, por assim dizer, de se empenhar na cultura da vinha. Mas à décima primeira hora os pagãos foram chamados, tendo-lhes sido dirigidas estas palavras: «Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?» De fato, ao longo de todo aquele lapso de tempo por que o mundo passou, os pagãos tinham negligenciado o trabalho que leva à vida eterna, e ali estavam, daquela maneira, o dia inteiro sem nada fazer. Mas reparai bem, irmãos, o que respondem à pergunta que lhes é feita: «É que ninguém nos contratou.» De fato, patriarca algum ou profeta se acercara deles. E que quererão estas palavras dizer: «Ninguém nos contratou para trabalhar», a não ser: «Ninguém nos pregou os caminhos da vida»?

Mas nós, que invocaremos então em desculpa própria, se nos abstivermos de realizar boas obras? Pensai bem: recebemos a fé ao sair do seio de nossa mãe, escutamos as palavras de vida desde o berço e fomos alimentados ao peito da Santa Igreja, dela bebendo, ao mesmo tempo que o leite materno, o néctar da doutrina celeste.


«Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?»

Podemos repartir estas diferentes horas do dia pelas idades da vida de cada homem. A madrugada é a infância da nossa inteligência. A terceira hora poderá corresponder à adolescência, pois o sol começa já, por assim dizer, a tomar altura; é quando os ardores da juventude começam a aquecer. A sexta hora é a da maturidade: o sol como que estabelece nesse momento o seu ponto de equilíbrio, pois o homem está na plenitude da sua força. A nona hora designa a velhice, quando o sol desce de alguma forma do alto do céu, porque os ardores da idade madura arrefecem nesse tempo. Enfim, a décima primeira hora é aquela idade a que chamamos a velhice avançada. […] Dado que uns são conduzidos a uma vida honesta logo na infância, outros durante a adolescência, aqueloutros na idade madura, aqueles na velhice, outros ainda em idade muito avançada, é como se fossem chamados para a vinha em diferentes horas do dia.

Examinai bem, portanto, a vossa maneira de viver, irmãos, e vede se começastes a agir como os trabalhadores de Deus. Refleti bem e considerai se trabalhais na vinha do Senhor […]. Aquele que até à sua última idade negligenciou viver para Deus é como o trabalhador que ficou sem nada fazer até à décima primeira hora […]. «Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?» É como se dissesse com toda a clareza: «Se não quisestes viver para Deus durante a juventude e a idade madura, arrependei-vos ao menos na idade derradeira. […] Vinde, ainda assim, para os caminhos da vida» […].

Não foi à décima primeira hora que veio o bom ladrão? (Lc 23,39s). Não foi por causa da idade avançada, mas por causa do suplício, que ele chegou no ocaso da sua vida. Confessou Deus na cruz, e deu o último suspiro quase no preciso momento em que o Senhor dava a sua sentença, E o Senhor do Reino, que antes de Pedro admitiu o bom ladrão nas delícias do paraíso, distribuiu bem o salário ao começar pelo último.

São Gregório Magno (c. 540-604),
Homilias sobre o Evangelho, n°19
Fonte: Evangelho Cotidiano

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